sábado, 15 de janeiro de 2022

o que faltou para eu poder ser amado por você, um dia todo calado, um dia todo aonde eu não demostra-se minha força, um dia todo aonde eu engoli-se o medicre e arrota-se satisfeito, um dia esticado em retralhos de compreensão. eu te disse que seria esse objeto que precisa ser chutado por baixo da mesa, por falar alto e por quase sempre não aceitar o contrato com vazio. sou inteiro, completo-complexo. não havia chances de autoservidão. não servi ninguém em toda minha vida. xinguei minha mãe. cuspi no meu pai. coloquei piolhos na cabeça da minha avó. sou essa violência desde o primeiro suspiro. gostaria de te dizer que se eu pudesse ser acessível. frágil. fraco. eu seria por você.  


terça-feira, 3 de setembro de 2019

a falta de domínio

''Tudo que posso te dizer hoje é que fique, hoje não é nosso dia, mas fique...'' - Fernanda Young


_ Me perdoa. Eu não sei falar, vou te escrever tudo o que penso, prometo.
Como me atordoa esse cara, eu não sei que porra fiz de manter isso a tanto tempo. 
_ Não quero as merdas de suas palavras escritas, quero ditas. Você é louco ou o que? Chega Rafael! Agora não estou brincando, eu preciso manter a calma. Eu sei, sei mesmo que enxergamos o mundo de maneira diferentes e eu e você estamos certo em nossas posições. 
Rafael sentado, me olhando de baixo. Aposto que está com raiva mas sequer ela consegue fazer com que esse desgraçado fale alguma coisa, não vou conseguir ficar relativizando tudo. 
_ Rafael para de me olhar. 
digo gritando desesperadamente, misturando choro, angústia e espera.
_ Quer saber? sua mãe estava totalmente certa, você é um cara vazio, sem personalidade, não sabe se defender, eu te abuso e você não me diz nada!
Rafael coloca a jaqueta sobre suas pernas, estava frio, havia a brisa do mar e tempo estava chuvoso. 
Será que ele sente alguma coisa? Ele disse que tentou se matar a dias atrás, mas pouco me importo que se mate logo! Mas tenho certeza que é mais um de seus devaneios, ele não tem coragem nenhuma para se matar.
_ Me diz você não concorda que não devemos mais nos ver? 
Olho fixamente a ele, fazendo-o sentir que não tem outra opção a não ser me responder. Passa-se o tempo e ele não diz nada, apenas o troca-troca de olhares entre eu e o chão.
_ Rafael
Em forma de sussurro, responde:
_ Sim.
_ Se você não concorda, pode dizer também. Eu respeitarei e poderemos debater. Você sabe, não posso manter mais essa relação. Eu preciso muito de uma pessoa que fale. 
Em um tom acalmado continuo a descrever o que esperava de uma pessoa.
_ Eu não quero ser o dominante a toda hora, não quero ter que escolher o restaurante que vamos comer sempre, o role que vamos dar, se vamos ou não usar drogas, se vamos ou não ter procurar empregos registrados. Eu quero ser pelo menos por uma vez a pessoa que é puxada pela mão.




domingo, 21 de julho de 2019

Trova de amor e dor à um jovem rapaz

Em teu corpo que nunca tocaste
me guardo 
em um soluço
da minha fala de amor

Me apele te dizer sobre teus olhos
estes que sobre mim causam
 de um todo 
desejo

Além do carnal
 do obsceno que vivo
no celestial encontro teu corpo
selado pelo meu desejo

Se te tereis no tempo que vens
não me importa
tu és minha raiz de desejo
meu sopro de vida

de divindade te transformo
para a profanidade do meu ser 
não te encontrar

como posso te ter menino-luz?
se sou de um todo escuridão?
dela
 faço vida e morte

domingo, 7 de julho de 2019

Os meninos do interior.


''Por que teus olhos ficarão abertos para quem os viu uma única vez. Todos irão sempre contra ti, por que hás de querer um mundo novo e diferente, por que és estranho e diferente para nosso mundo. És quase um louco porque não da atenção a toda gente. Dirão que és poeta, por que aparece poesia nos teus gestos, como aparece fé na oração de um crente. Amaste quase todos os homens. Mas o amor agora é tão difícil. Não existes para mim, mas agitado, febril. Quase doente, és vivo. Vivo demais para viver conosco.'' -Hilda Hilst, Baladas - poema XVII.




Nas terças tinha aula de educação física, as duas últimas, era fim de ano e tudo o que tinha eram recriações esportivas. O que me exprimia a matar-las. No entanto não queria chegar mais cedo em casa. Não haveria nada mais a se fazer por lá, além da grande lista de filmes da nouvelle vague que ainda tivera que ver. Tuas mensagens chegam. Não é disso que deveria fazer essa terça. Mas o que importa em por um pouco de você no meio das minhas leituras.

 A biblioteca sempre na mesma esfera espiritual: silêncio profundo com sussurros respiratórios. De vez ruídos de cadeiras denunciando a impaciência do acomodado. No balcão que ficava na frente da porta, dois estagiários e a moça que trabalhava a anos, provavelmente concursada, muito querida e atenciosa, me fez um dos maiores atos de empatia intelectual, me apresentou Beauvoir e suas questões mais aprofundadas que costumava me ocupar. Fico aflito, será que conseguirei ler algo antes que você chega-se e me tome-se o olhar? Os estagiários, eram garotos gentis, mas não pareciam entender muito de literatura, eram de outras áreas, cursavam administração, nunca compreendi a lógica. Teve até um tempo em que estagiou um estudante de biológicas, foi o mais perto de uma amizade que tive com um estagiário da biblioteca, ele me estimulava a gostar de biologia, um dia lembro-me que de tanto ele insistir eu levei um livro de genética, claramente não peguei no livro depois de colocar-lo sobre a mesa do meu quarto.

Me guio até a estante de poesia, poesia é coisa rápida, não tem ordem, uma frase pode valer a leitura do dia todo. Neruda, era meu companheiro mais fiel nesse tempo, nunca levei ele para casa, gostava de ler ali, parecia que esse era meu ponto de encontro com ele. As tardes de terça - quando fugia da escola mais cedo. Mas Neruda, é muita paixão, veemência-exaustão de sentir. No pensar que você chegasse e me teria num delírio infame de paixão, e que não me darias ouvidos, guardei-o na estante. O que ler em tua espera? Um poeta político? isso me ajudaria talvez em um possível debate que provavelmente travaríamos no meio dos teus silêncios e perguntas sociológicas. Brecht?

 Está no balcão entregando os livros, e justificando o por que do atraso, e como sempre tentando se livrar da multa. Te olho vulgarmente como quem julga por impulso, mas admira por essência. Me omito no instante de sair da minha busca, Você nota rapidamente o meu desfoque, e grita meu nome no maior volume que o ambiente permitiria, na verdade, não permitia. Os estagiários fingiram não ver a expressão grotesca que criou desatentos nas mesas de estudo. Deixo Brecht para uma outra hora, sei que seus ditos terá um pouco dele. Como numa mesa de debates universitários, tu inicia uma apresentação do que poderia ser o diálogo nesta tarde. Era algo haver com música, eu como sempre tentando te acompanhar, como Simone acompanhava Sartre em direção a seu desenvolvimento, temos muito dos dois em nós. O que nos divide dos dois é o sexo, você me acha assexual demais, e eu acho que não sei fazer papel dominante com alguém tão cheio de si. Esse nunca foi o foco.

Evitando com silêncios entrar em assuntos divergentes queria mais uma tarde só de luz, árvore e ficar nessas escadas até chegar a hora de ir. Tu como uma coruja, nota o meu desprezo com o que vem por minutos tentando iniciar, teu ego te silencia, como se tua voz, só consegui-se validade através das minhas respostas. No momento, escolho não amaciar  teu desgosto, sabia que tua mente estava formulando mil coisas e teu peito ofegante desejava expressar tuas perguntas. O tempo nisso virou só presença, como se jamais tivera tido um passado ou ideia de futuro, era só dois corpos deitados nas escada do teatro municipal.

 O corpo das palavras que busquei dizer para ir embora, eram desossadas, versos invertebrados, covardia e inexpressiva vaidade em que o fim se ilustra. Você entende como sempre um bom entendedor o faz, era nosso último tempo juntos antes de viajar. Não expressa a angústia que sentia sempre ao dizer, no dizer soa um adeus silencioso e agradecido pela troca de peso que fizemos um ao outro. 

quinta-feira, 20 de junho de 2019

O sol desce mais uma vez no sítio dos ressentimentos.


Ao findar o dia
entrevejo a harmonia
no cheiro
das flores colhidas
lembro-me da pequena Cordélia
olhando ao teto-sem-foro
criando de mil estórias
até o adormecer
enquanto eu
escondia o pecado do dia
na poesia